Os relatos e as poucas imagens que aparecem na mídia sobre a população em situação de rua, em sua maioria, mostram o grande número de violações de direitos e desrespeito que essas pessoas sofrem no Brasil. Mais que isso, desvelam histórias de vida a que milhares de pessoas são submetidas cotidianamente em diversas cidades brasileiras. Nesse sentido, o CFESS reafirma a luta e defesa do Serviço Social brasileiro pelos direitos humanos dessa população, em especial neste Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua, 19 de agosto.
A conselheira do CFESS Régia Prado, que já trabalhou no Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) em Maracanaú (CE), afirma que a repercussão das graves situações envolvendo esta população mostra reflexos de uma economia neoliberal sob o controle do sistema financeiro, que acirra as desigualdades sociais e a distância entre ricos e pobres, um verdadeiro “apartheid social”.
“O desemprego estrutural e as relações de trabalho precarizadas se ampliam, à medida que as economias capitalistas não conseguem absorver o enorme contingente de trabalhadores disponíveis no mercado. As implicações desse processo têm sido o aumento do desemprego, empobrecimento da classe trabalhadora e o aprofundamento das desigualdades sociais, em que o fenômeno social população em situação de rua é uma de suas expressões, que ganha um maior visibilidade na cena contemporânea brasileira”, explica a conselheira.
Para o coordenador nacional do Movimento da População em Situação de Rua (MNPR), Leonildo Monteiro Filho, alguns avanços foram conquistados, como a publicação do Decreto 7053/09, que criou a Política Nacional da População em Situação de Rua. “Essa normativa fortaleceu a visibilidade dessa população no país, além de garantir um determinado recurso para as ações em defesa dos direitos do segmento. Além disso, conseguimos também a criação do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramentos da Política”, destaca Monteiro. O coordenador acrescenta que ainda é preciso, no entanto, fortalecer a organização do Movimento em todo o país, devido às dificuldades de orçamento e força política para chegar em mais estados.
Imagem da conselheira do CFESS Régia PradoConselheira do CFESS Régia Prado falou sobre a experiência com a população em situação de rua (foto: Rafael Werkema/CFESS)
“Ainda temos o desafio de garantir o apoio e adesão dos gestores, como prefeitos e governadores, à defesa e cumprimento dessa normativa. Além disso, com o aumento de pessoas nessa situação, devido à situação econômica e social do país, a violência e o preconceito contra essa população também vêm crescendo”, alerta Leonildo.
O papel de assistentes sociais
O/a assistente social, nos diversos espaços ocupacionais e no Serviço Especializado para População em Situação de Rua, ofertado Centro POP, tendo como referência a Lei de Regulamentação da Profissão e os princípios do Código de Ética Profissional, desenvolve a atuação profissional em vários âmbitos: acolhida e a recepção das demandas expostas pelos/as usuários/as, bem como prestação de informações, orientações e encaminhamentos necessários à rede socioassistencial, às demais políticas públicas e órgãos de defesa; participação do Plano de Acompanhamento Individual e/ou Familiar, considerando as especificidades e particularidades de cada usuário/a e respeitando a sua autonomia; realização de atividades, por meio de metodologias e técnicas individuais e coletivas que possibilitem debater a realidade social e construir novos projetos de vida; realização de visitas domiciliares a familiares e/ou pessoas de referência desse indivíduo ou família que está em situação de rua, dentre outras ações.
Embora desconhecidas por muita gente, as multideterminações sociais que promovem o fenômeno social “população em situação de rua” não se explicam a partir de um só aspecto (como a falta de moradia, trabalho e renda, rompimento dos vínculos familiares, adversidades pessoais e doenças, e fatores ligados a desastres geográficos, como inundações e secas). “Por isso, enquanto categoria profissional, a atuação deve ser crítica, ética e propositiva, visando a romper com as diversas formas discriminatórias em relação à população em situação de rua e fortalecer a luta por seus pelos direitos, com base nos princípios de nosso Código de Ética e das legislações que normatizam nossa profissão”, ressalta Régia Prado, conselheira do CFESS.
O coordenador do MNPR, Leonildo Monteiro, destaca a importância de assistentes sociais no acolhimento à população em situação de rua. “Hoje, várias assistentes sociais vêm pra luta conosco, ajudam em nossa organização política. Também são fundamentais os eventos que alguns CRESS realizam nos estados. No entanto, algumas profissionais ainda desconhecem nossas reais necessidades, entendendo que se limitam apenas ao simples assistencialismo”, observa Monteiro.
Imagem do coordenador nacional do MNPRLeonildo Monteiro é o coordenador nacional do MNPR (foto: reprodução/Facebook)
Você sabia que pode participar?
O CFESS entende que o fenômeno “população em situação de rua” tem como pano de fundo os fatores estruturais inerentes ao capitalismo, como o desemprego, falta de renda e condições de vida e trabalho extremamente precarizadas, além da ausência de políticas públicas estruturantes. Essa realidade se agrava com a atual política do governo Michel Temer, com o apoio de ampla maioria do Congresso Nacional, sob o discurso de equilibrar as contas públicas e garantir a retomada do crescimento por meio do desmonte da máquina pública e um severo ajuste fiscal, que acarreta a regressão das políticas públicas e a retirada de direitos de trabalhadores/as.
A partir daí, percebe-se que é cada vez mais significativa a presença de indivíduos e/ou famílias que têm as ruas como espaço de moradia e/ou sustento nos grandes centros urbanos do país, sob uma suposta (in)visibilidade por parte da sociedade e do poder público, vivenciando diversas formas de violações dos direitos: desemprego, fome, frio, violência física e moral, preconceito, solidão, indiferença, bem como inúmeras barreiras no acesso às políticas de saúde, assistência social, educação, trabalho e renda, habitação, alimentação e segurança e outras.
Diante dessa realidade, a conselheira do CFESS enfatiza que a categoria de assistentes sociais, além da atuação diretamente nos serviços e nas políticas públicas, pode se inserir nos movimentos e entidades de apoio à população em situação de rua. “Temos os Fóruns em Defesa da População em Situação de Rua nos estados e municípios, os Comitês Intersetoriais da População em Situação de Rua federal, estaduais e municipais, os conselhos de políticas públicas de defesa, além do importante Movimento Nacional da População em Situação de Rua”, completa Régia Prado.