Por Carla Ninos
O desafio de atendimento aos/às usuários(as) de substâncias psicoativas em tempos de crise sanitária foi o principal tema da Semana de Políticas sobre Drogas, realizada via web, de 21 a 25 de junho, tendo como público alvo as famílias, sociedade e profissionais da rede de atendimento em geral de saúde, educação, segurança, assistência social, entre outras envolvidas, direta ou indiretamente, no atendimento à população.
A semana, promovida pela Adjunta de Justiça da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp-MT), teve como um dos parceiros o CRESS/MT e visava a promoção do conhecimento sobre o uso de drogas, as políticas públicas e a participação familiar, comunitária e social.
O terceiro dia da semana foi marcado pelo webinário “O sujeito, as circunstâncias, a abordagem psicossocial no uso de drogas e Direitos Humanos”, com a mediação da assistente social, conselheira do CRESS/MT e Mestra Vanessa Martins Galhardo Lopes e a presença dos palestrantes Ms. Robson Alves de Paula – Direitos Humanos e Dr Alexandre Guedes da 7ª Promotoria de Justiça de Cuiabá.
A assistente social do CRESS/MT aponta que, para se ter um debate qualificado sobre as drogas, é preciso considerar a condição de principal problema do país: a internação (especialmente a compulsória) como primeiro recurso e exclusivo de tratamento, bem como a segregação como forma de tratar o problema.
“Vivemos uma intensa e inútil pretensão de proibição do consumo como objetivo de evitar riscos e danos decorrentes do uso, causando, com isso, o fortalecimento da abstinência, que imposta e associada à legítima intromissão do Estado nas liberdades individuais, da desastrada intervenção do sistema penal e, até mesmo, a declarada guerra insana e sanguinária com a introdução de poder severamente punitivo, violento e estigmatizado, não traz resultados nem ao que se refere consumo e, tampouco, na circulação das substâncias proibidas”.
O palestrante Ms. Robson Alves de Paula, iniciou sua fala abordando a subjetividade do consumo de álcool e outras drogas e as políticas públicas brasileiras. Para Robson, que é psicólogo, cabe à psicologia o papel de fomentar o posicionamento crítico sobre o tema das drogas, para dentro e para fora da profissão, focando nos modelos de assistência, nos direitos dos usuários e nas redes de interesses envolvidas. “No geral, nós temos visto um descompasso do diálogo das complexas necessidades dos/das usuários(as) com o modelo de acolhimento e assistência, ressaltando soluções, por vezes, estigmatizantes, criminalizadoras e preconceituosas, levando a situações de sofrimento e abandono”.
Já o Dr Alexandre Guedes da 7ª Promotoria de Justiça de Cuiabá, iniciou sua fala parafraseando Paulo Freire, ao afirmar que os direitos humanos é um conceito revolucionário porque é imprudente. “É revolucionário, porque os direitos humanos como categoria, como definição de que todo integrante da espécie biológica denominada homo sapiens, tem a mesma importância intrínseca dos seus semelhantes. E é, por isso, que é um conceito imprudente, uma vez que não importa o que a pessoa faz, tem ou de onde vem. Todo ser humano tem a mesma importância do seu semelhante”.
Alexandre afirma, ainda, que os direitos humanos também implicam que cada uma das vidas de cada ser humano é única, preciosa e individual. Portanto, a categorização de indivíduos trabalha o sentido excludente. “O Estado Democrático de Direito estabelece que todos(as) os/as brasileiros(as) são iguais, o problema é que, na questão das drogas, se parte do conceito de não apenas categorizar, mas de excluir as pessoas que usam drogas, pela tal da comunidade de gente de bem. Então, o/a usuário(a) é desumanizado(a) e excluído(a). E um dos grandes problemas é que se usa o Direito Penal como ferramenta de execução dessas categorizações moralistas. E, uma vez que esse usuário(a) entrar no sistema jurídico penal, entrará em um moinho, em que a própria existência de sua ficha inicial vai fazer com que essa pessoa continue rodando até ser esmagada”.
Os objetivos declarados das políticas antidrogas sinalizam a inutilidade da proibição, os riscos, danos e sofrimentos causados pela proibição, principalmente, pela expansão do poder punitivo, da criminalização da pobreza e da judicialização das expressões dessa questão social. “A proibição às selecionadas drogas ilícitas forneceu e fornece o impulso requerido pela consolidação de uma globalmente uniforme tendência punitiva e uma expansão do poder punitivo sem paralelos”, conclui Vanessa Lopes.
Veja o webinário completo: